COMO APROVEITÁ-LAS?
Com ou sem
vítimas, com ou sem perdas
materiais, qualquer que seja, o acidente deixa ensinamentos, dos quais devemos, e
- como prevencionistas - temos a obrigação de extrair e aplicar tudo o
que for possível para evitar a sua repetição.
Quantas vezes, ao realizarmos a
perícia de um acidente grave ou fatal ouvimos as expressões: “eu tinha dito a ele...”, “estava na cara que iria acontecer
isso....”, “eu avisei mas ninguém deu
atenção....”, e assim por diante.
Sob o meu ponto de vista, os principais fatores, observados
ao longo de minha atuação profissional como Auditor Fiscal do Trabalho, são os seguintes:
Para este
fator concorre a falsa ideia de que somente acidentes com danos pessoais que provoquem o afastamento do
acidentado necessitam da
competente análise. E, infelizmente,
em diversas ocasiões ouvimos essa justificativa de profissionais de
SST, evidentemente tentando tapar a
falha por não ter seguido o que reza o subitem 1.5.5.5 da NR 01
Numa inspeção de uma obra, soube que tinha havido no dia anterior um
deslizamento de terra aprisionando parcialmente um trabalhador que, felizmente,
não se ferira.
Entrevistando-o, o Mestre me interrompeu dizendo que tinha sido só um
“barrinho nas canelas”. Ao verificar o
local, encontrei um talude quase
vertical com aproximadamente 4m de altura.
Informei a ambos que o “barrinho nas canelas” na verdade tinha sido um
milagre, pois o volume de terra
desprendido poderia ter sido maior e
causado a morte do trabalhador. Após a
interdição dos trabalhos a empresa foi notificada (e autuada) para providenciar
o devido escoramento do local sob competente projeto.
3 - receio em divulgar o acidente e suas possíveis consequências, por temer repercussões negativas para os envolvidos ou para a empresa.
Um caso muito comum e, infelizmente,
muito grave, é o que ocorre na
indústria da construção, onde um
trabalhador não usa o cinto de segurança adequadamente, e seus colegas não informam os superiores por
óbvios motivos. Há algum tempo
atrás, e dias após um treinamento
específico para a responsabilidade comportamental dos trabalhadores de uma
empresa, em que eu pessoalmente
participei, tivemos a ocorrência de um
acidente fatal, pela queda de um
trabalhador da altura de aproximadamente 100m ,
devido não estar usando o cinto de segurança. Estatelou-se no solo com um cinto caro, quase
sem uso de duplo talabarte amarrado
na sua cintura. Como explicar o fato de
não ter usado o EPI que poderia ter salvado sua vida? Durante a análise do acidente, na entrevista de dois colegas da vítima, ficou-se sabendo que era comum ele não usar o
cinto.
Ficamos diante de dois “dedos-duros” post-mortem. E agora ?
Com receio de criarem algum mal-estar para o colega contribuíram para a sua morte.
Num outro caso, o Eng. de Segurança, com o apoio de seus superiores, somente analisava e registrava nas estatísticas da empresa os acidentes que “eles” considerassem graves e merecedores de entrarem para as estatísticas, mesmo tendo havido casos de fraturas e afastamentos superiores a 15 dias. Tudo para evitar a má repercussão da sua unidade de trabalho e não prejudicar o cálculo do PLR....
4 - falta de apoio da direção da empresa para as corretas ações da CIPA e/ou SESMT, referentes as providências necessárias.
Este é um caso particularmente muito comum nas empresas que consideram Segurança e Saúde do Trabalhador como um custo desnecessário. São despesas sempre relegadas a serem dispensadas por medidas de economia.
Numa entrevista
com dirigentes de uma empresa, me foi confessado que, se eles incluíssem os
custos com aquisições de EPIs, perderiam a licitação para concorrentes que não
consideravam esses itens. O problema, evidentemente, estava no fato da
contratante principal não exigir que as propostas contemplassem todos os
quesitos necessários pertinentes à SST.
Responsabilidade solidária exigida pelo item 1.5.8 da NR 01
As próprias reuniões de análise de acidentes ficam descaracterizadas pela não participação de representantes da Direção. E sugestões para eliminar ou neutralizar as causas ficam para o ano seguinte, principalmente em se tratando de um acidente sem vítimas ou sem perdas materiais de monta.
Assim foram vários casos ocorridos com empresas de grande porte obrigadas pela necessidade de serem feitas licitações, previsões orçamentárias etc.....
Tivemos um caso,
de acidente com gravíssimos ferimentos num trabalhador que caiu de uma
escada de mão que se apoiava sobre um poste metálico para iluminação. Devido o alto grau de corrosão na base do
poste, ocorreu seu tombamento levando a
escada e o trabalhador ao solo.
A causa já era conhecida, e o acidente também já era previsto não somente junto a esse poste mas também em inúmeros outros postes na mesma área, onde havia várias estruturas metálicas compondo escadas, passarelas, grades de proteção em aberturas de pisos, guarda-corpos e ... postes de iluminação. Todas elas com fortes danos devido à corrosão.
Além da causa já conhecida, também eram muito conhecidas as dificuldades em solucionar essas irregularidades relacionadas à: plano orçamentário e necessidade de projetos, orçamentos e licitações. Logicamente o prazo previsto para a regularização era indefinido.
5 - precariedade da análise do acidente, quando feita, ou das medidas implementadas
Em segurança do trabalho não se procuram culpados, mas sim quais as causas que levaram ao evento indesejado, e como fazer para que não mais se repita, ou que, se repetido, tenha mínimos danos.
Houve um
caso em que um trabalhador teve dois dedos da mão direita amputados numa serra
circular, mesmo depois de já ter havido
um “pequeno” acidente com um seu colega
de trabalho, que não se feriu, por não usar um dispositivo empurrador para
a madeira e nem posicionar corretamente a coifa protetora do disco.
.......Ah, eu tinha dito que ele precisava prestar mais atenção ...
6 - inexistência (e/ou ineficiência por falta
de conteúdo e/ou “qualidade”.)
de OS - Ordens de Serviço e APT- Análise Prévia de Tarefa, incluindo as recomendações de segurança e
necessidade de estarem presentes proteções coletivas e individuais necessárias;
.................................................
A análise de qualquer acidente, com ou sem lesões pessoais, com ou sem danos materiais, independentemente do método escolhido, exige a investigação de todos os fatores que, individualmente ou em conjunção, poderiam ter evitado ou minimizado os danos; envolve o reconhecimento de todos os aspectos ambientas, materiais, pessoais, operacionais e organizacionais que configuraram o ocorrido.
Portanto, o analista tem que dominar todos esses
aspectos pois, caso contrário, dará como
bom e eficaz um procedimento ou documento simplesmente por ele existir, mas
desprovido de conteúdo de qualidade prevencionista, o que é um absurdo, mas que – lamentavelmente – já foi por mim
constatado em várias vezes junto à
pessoas ou empresas, inclusive com
atividades de gerenciamento e/ou de certificação de qualidade.
O aproveitamento como lição vai ser medido pela proposição de:
- quais
medidas podem ser implementadas (estratégias) para ser evitada – ou minimizada a níveis
toleráveis – a eventual repetição do
acidente,
- custos e
prazos de execução dessas propostas;
- escolha da
proposição e cronograma de execução
- responsáveis; pela execução, acompanhamento e aferição da eficácia das medidas;
- legislação pertinente e procedimentos legais eventualmente necessários (comunicações legais à órgãos públicos e sindicais)
- divulgação à CIPA e todos os interessados e potencialmente expostos
.............................
No âmbito da Legislação à cargo da SIT/MTE inúmeras são as medidas que, à partir das análises, estudos e discussões tripartites, foram implementadas com enorme êxito na prevenção de acidentes no Brasil, dentre as quais destaco a nova redação da NR 12 (Máquinas e Equipamentos) e a elaboração da NR 35 (Trabalhos em Altura).
Infelizmente, a meu ver, quando da elaboração do novo texto da NR 01, perdeu-se a oportunidade de ser exigido para que todos os acidentes fatais, independentemente de qual fosse a atividade laboral1, fossem comunicados ao órgão regional do MTE para a devida análise sob o olhar prevencionista de quem procura as causas e não os culpados, conforme já é exigido em algumas NR2
(1) – Em
julho de 2011 protocolei essa sugestão no MTE
(2) –
Atividades na Indústria da Construção 18.16.23
18.16.23 Em caso de ocorrência de acidente fatal, é
obrigatória a adoção das seguintes medidas:
a) comunicar de imediato e por escrito ao órgão
regional competente em matéria de segurança e saúde no trabalho, que repassará
a informação ao sindicato da categoria profissional;
b) isolar o local diretamente relacionado ao acidente,
mantendo suas características até sua liberação pela autoridade policial
competente e pelo órgão regional competente em matéria de segurança e saúde no
trabalho;
c) a liberação do local, pelo órgão regional
competente em matéria de segurança e saúde no trabalho, será concedida em até
72 (setenta e duas) horas, contadas do protocolo de recebimento da comunicação
escrita ao referido órgão
E também: Atividades de Mineração 22.37.7 /
Trabalho Portuário 29.26.5 / Construção Naval 34.18.9
/
Plataformas de Petróleo 37.29.6
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